Opinião: Legado nos Ossos de Dolores Redondo



 



O julgamento do padrasto da jovem Johana Márquez está prestes a começar. A ele assiste uma grávida Amaia Salazar, a inspectora da Policía Foral que há um ano resolveu os crimes do denominado Basajaun, que semearam de terror o vale do Baztán.
Amaia também reuniu as provas incriminadoras contra Jasón Medina, que imitando o modus operandi do Basajaun assassinou, violou e mutilou Johana, a filha adolescente da mulher.

De repente, o juiz anuncia que o julgamento será cancelado: o réu acaba de se suicidar na casa de banho do tribunal. Face à expectativa e à irritação que a notícia provoca entre a assistência, Amaia é chamada pela polícia: o réu deixou um bilhete de suicídio dirigido à inspectora, um bilhete que contém uma mensagem concisa e inquietante: Tarttalo.

Essa única palavra que remete para a personagem fabulosa do imaginário popular basco desvendará uma trama terrífica que envolve a inspectora até culminar num trepidante desfecho.
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Depois de ter lido "O Guardião Invisível", o "Legado nos ossos" era a escolha natural para uma das leituras seguintes. Este é o segundo volume da trilogia de Dolores Redondo que, confesso, me deu um gostinho especial.

O terceiro e último livro da trilogia, "Oferenda à Tempestade", é publicado hoje.







Após o bárbaro assassinato de Johana, tudo parece pronto para se poder aplicar a justiça quando o assassino, o padrasto, se suicida! E é quando Amaia é confrontada com um bilhete que lhe é dirigido e que diz: Tarttalo!



A história, na linha do anterior, permite-nos acompanhar a investigação de um provável assassino em série que de alguma forma se foca em Amaia, deixando-lhe pistas intencionalmente. A sua família volta a estar, de uma ou outra forma envolvida no enredo. Por outro lado, é chamada para a investigação da profanação de um altar, investigação a que não dá grande atenção até que algo acontece, invocando aqui, mais uma vez, a história da região.

 

É interessante ver a mistura do misticismo e lógica racional, algo que divide a personagem Amaia. É algo a que não estou muito habituado nos livros que leio. Poderia tentar encontrar algum paralelo com os livros de Yrsa Sigurðardóttir, mas, ainda assim, com notórias diferenças quer na abordagem, quer na manipulação dos temas e no efeito na história. Por isso acho original (e corajosa) a aposta da escritora, que aproveita para trazer temas que acompanham as gerações mais antigas e que tendem a cair no esquecimento.



O que adorei neste livro? 


Para além da história, do suspense, de toda a mecânica, da originalidade e imaginação que se encontra no livro, há de facto algo que se destacou... Que me chamou a atenção... Adorei poder percepcionar de uma forma tangível a evolução da escrita da escritora. A autora presenteia-nos com uma evolução a vários níveis, e de uma forma tão exposta que nos desarma, superando as expectativas que criamos para aquele livro. A autora subiu a "parada".


Mas o seu cunho está lá, não é uma mudança incoerente, mas consistente com o livro anterior. Há um foco maior no que é importante e no que serve a história. Há uma preocupação na dinâmica da história, no encadeamento natural das cenas.


Amaia, apresenta-se profissional e focada no trabalho, que é a sua prioridade, mas com uma maior preocupação com a sua família, principalmente com o seu filho que acabou de nascer.  É a maternidade que Dolores Redondo utiliza com ignição para a evolução da personagem. E não deixa de ser interessante ver a confrontação entre a relação de Amaia com a sua mãe e a relação que está a criar com o seu filho. Estou curioso para ver qual o desfecho desta evolução e como a personagem vai gerir estes conflitos internos. 


Gostei, quero ler o próximo que saí hoje.  



Podes ler aqui a opinião do livro anterior:

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